sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

José Leandro

Ambiente rústico, acolhedor e bastante popular entre os locais existe neste café, snack-bar e restaurante.
Apresenta uma cozinha para todos os gostos e feitios. Espaço ideal para a realização de todo tipo de eventos e inventos, comandado pelo chefe Arlindo, sportinguista de gema, mas com um coração grande de leão. Tudo e todos vêm parar aqui. Pouso de muitos cenários e figuras caricatas, como o rei do karaoke, artista de invulgar craveira, Hélio Rodrigues, grande cantador e fã dos Queen e da música I want to break free, que bebe vinho do Porto por causa da voz. Também um grande ciclista, com uma bicicleta BMW de alta cilindrada e alta-fidelidade Pionner, recentemente proibido pelo médico de andar de bicicleta por causas ainda desconhecidas. Assim como os tocadores de cavaquinho Benícios e Ricardo, que tocam e cantam música popular, sempre envolvidos em canecas de vinho e garrafas de cerveja.
Mas a principal figura de destaque é o nosso presidente, que alterna os períodos de presença assídua com os de completa evasão.
José Leandro é o seu nome, mais conhecido pelo presidente, rapaz de 28 anos, português, honesto, magro, tem como transporte preferido e único a bicicleta, gosta de descansar, exagera na comida, não bebe álcool, mora num quarto alugado, porque não gosta de viver com os pais, gosta da liberdade e da justiça e quer ser presidente da câmara, da junta de freguesia, deputado ou outro cargo político qualquer daqui a quatro anos.
Já tem o seu mandatário político, sede para a campanha, a tipografia e um saco azul porque é adepto do glorioso FCP e apoiantes são aos milhares.
Diz ser neto do Salazar e é contra todas as minorias: ucranianos, açorianos, velhinhos e afins.
Depois do apoio a diversos candidatos e de ver frustradas as diversas vitórias, desde o presidente da câmara até ao Mário Soares, vê-se na iminência de ser o candidato do povo, donde surgiu o slogan «Zé Leandro, o candidato do Povo».
Militante convicto do Partido Socialista, ou Nacional-Socialista, anda neste momento a tirar o curso para político, já tem dois cartões, um da juventude, com fotografia e tudo, e outro do partido; paga anualmente 20 euros e já pode ser político.
Figura caricata, mas com carisma, era vê-lo na festa popular de São Gonçalo, que se realiza no penúltimo domingo de Janeiro, de peito erguido, nariz empinado, metido no seu fato e gravata, e a sua comitiva saudando todos que por eles passam e que o reconhecem dizendo: «Olha o presidente!»

Rapaz dos sete ofícios, tudo em part-time, quer dizer, duas horas por dia. Empregado de mesa, se lhe derem o jantar; aprendiz de padeiro, vendedor de automóveis (que se saiba nunca vendeu nenhum), mas lá vai de café em café tentar vender um Peugeot 205 da última geração, porque ainda andava.
Visto possuir um grande sentimento de grandeza, imagina que é especial ou possui habilidades especiais, é um escolhido, um líder político, capaz de se considerar uma grande personalidade. É hiperactivo, os pensamentos correm de forma incontrolável, quem olha para ele repara na grande confusão de ideias. A velocidade dos pensamentos é superior à da expressão verbal, o que origina uma interrupção constante de temas e sucessiva fuga de ideias.
Mesmo quando está alegre, explosões de raiva acontecem, geralmente provocadas por alguma provocação. Entoa bem alto a sua voz e responde à letra:
«É preciso uma câmara, um tribunal, um hospital e ninguém faz, é só gastar dinheiro nos passeios e levar os velhinhos a andar de camioneta; a culpa é do presidente, que é um borrachão!»
É contra estas e outras injustiças que o Zé luta. Animal político, dá expressão aos anseios ainda informes da comunidade e é contra as actividades ligadas ao trabalho, aos ofícios e aos negócios, considerando-as como inferiores.
Defende o Sócrates: «o doutor», diz ele, «tem sempre razão, ele é o meu patrão, dá-me o rendimento mínimo».
Não se pode cansar, tem que estudar, principalmente inglês, porque português é bem mais difícil e não é para todos. Estuda à noite e já é repetente, mas esforça-se e já vai no bom caminho, este ano é que vai conseguir!
É contra as «cunhas», só devem passar aqueles que têm mérito, «não é como a princesa que deu flores à professora e acabou o curso, sem sequer o nome saber escrever, sendo notícia no jornal regional».
— A Dr.ª Joana é que tinha dado uma boa presidenta, mas deixou-nos, foi para deputada, lá em Lisboa.
— Mas Zé, é ainda muito nova, tem muito tempo para ser presidente. E como é se ela concorrer às próximas eleições, tu ficas sem tacho?!
Encolhe os ombros e diz: «Vocês querem é pôr-me tolo para eu desistir e o Bernardino voltar a ganhar, tem que se acabar é com os senhorios, esses ladrões.»
Rapaz de sentido único, namoradas são aos montes, já esteve para casar diversas vezes, chega mesmo a comprar alianças de comprometido, coisas sempre sérias. Idealiza a casa, os móveis, mas no fim tudo desaparece e a desculpa surge sempre: «Tivemos uma zanga!»
Já esteve para ser pai, a Catarina Furtado estava grávida! É vê-lo em fotografia com a sua dama lado a lado e a quem não acredita ele mostra o poster com a sua rainha. Montagem fotográfica efectuada por um dos seus apoiantes, claro!
Quem o quer encontrar é procurar pela noite dentro, esteja bom tempo ou temporal, um passeio de bicicleta faz sempre bem e percorre lentamente as artérias desta cidade, falando consigo mesmo e elaborando mais um projecto de vida, um sonho por realizar, desabafos de uma vida sem destino entre sonhos e realidades.
Tanto aparece como desaparece, um prato de comida o faz regressar, mas não assenta, desaparece meses a fio como um vagabundo, está vivo, está morto, é impressionante com a capacidade de se deslumbrar.
A última profissão conhecida foi a de distribuidor de pastéis na sua magnífica bicicleta de cor amarela. Nessa altura alimentava-se exclusivamente de pastéis.
O único senão é que é diabético!
Nestes dias entrou no café de tacho na mão com calda feita. Ficou sem fogão, avariou-se e o esparguete ficou a meio, veio pedir ao chefe Arlindo se podia usar o fogão: «se vens para comer não há nada e se queres alguma coisa pede à D. Fátima».
Ainda teve tempo de contar a última novidade, «aceitei de volta a Sandra, ela quer voltar a namorar comigo».
Quando será a sua próxima aparição? Ninguém sabe, mas trará com ele um mundo repleto de ideias e sonhos mirabolantes, que até a nós nos fazem parar para pensar.

3 comentários:

Anónimo disse...

Fiquei sensibilizada ao ler o que escreveu. Vc é mt bom nisso! Achei interessante conhecer este seu lado literário. Parabéns! Continue sempre. Bj da sua amiga, Andréia.

Anónimo disse...

Parabéns!!!
Já sentia necessidade de ler mais, agora com vc a escrever, melhor ainda,
Bjs,
Nadeje.

Anónimo disse...

O "bipolarismo" de José Leandro, como tantos e verdadeiros políticos, também ambiciona lugares de destaque.
Sonhos por realizar, desabafos de uma vida sem destino, ao ritmo da pedalada da sua BMW, de alta cilindrada. Um conto delicioso.
ALobo